A data e turno da entrega no comércio eletrônico

Mentir a data de entrega passou a ser muito mais grave que anteriormente e a redução do prazo de entrega – um importante fator competitivo – passou a exigir gestão e processos muito mais complexos.

No estado de São Paulo (Lei nº 13.747, publicada no DO-SP em 08.10.2009), todas as lojas virtuais estão obrigadas a permitir ao cliente a escolha da data e o turno da entrega correspondente à sua compra, quando do fechamento do pedido na WebStore. Além disso, as lojas estão obrigadas a emitir um documento comprobatório de sua promessa de entrega. Em caso de descumprimento, a loja virtual está sujeita a multas muito pesadas.

Este artigo tem o objetivo de analisar as implicações desta obrigatoriedade na venda não-presencial.

As práticas e pressupostos anteriores à lei

  1. No fechamento do pedido, a WebStore informava ao cliente o prazo de entrega por item comprado. Este prazo, nas melhores lojas, é dependente de uma série de parâmetros: o tempo padrão do atendimento físico do pedido no Centro de Distribuição (logística interna), o tempo de trânsito (função do destino e do contrato com a transportadora – logística externa) e o tempo de reposição do item caso a loja venda antes de comprar (cross docking).
  2. Quando da transferência do pedido para o Back-office, o cliente era informado de que seu pedido fora incluído no sistema e seria submetido ao processo de pagamento.
  3. Um pedido poderia ser subdividido em entregas, dependendo da natureza do item (leve ou pesado, determinando o tipo de transportadora), dos diferentes prazos de entrega dos itens prometidos no momento do fechamento do pedido na WebStore e dos depósitos de onde os itens seriam expedidos
  4. Quando da aprovação do pagamento, o Back-office informava ao cliente a data em que cada entrega (subdivisão do pedido) será feita ao cliente.
  5. Desta forma, cada pedido percorria um conjunto de atividades com tempo padrão preestabelecido, caso algum deles não seja cumprido, a entrega seria feita com atraso.

Os pressupostos até então determinantes do prazo e da data de entrega

  1. A capacidade de atendimento físico dos pedidos tem sido considerada independente da carga de trabalho do Centro de Distribuição, embora os recursos sejam inelásticos (empilhadeira, docas, linhas de checkout, picker, conferentes, embaladores etc). Com isso, tem sido comum que a sobrecarga de trabalho no Centro de Distribuição venha gerando horas extras, atrasos e perda de qualidade.
  2. A grande maioria das transportadoras coleta as mercadorias no Centro de Distribuição da loja virtual e roteiriza a carga coletada em seus Terminais de Carga. Neste proceder, exceto em datas festivas, as lojas virtuais têm considerado que as transportadoras sejam capazes de transportar todas as mercadorias vendidas e entregá-las nos prazos previamente acordados. O pressuposto contido é que a frota das transportadoras por rota é infinita.
  3. A venda antes da compra (capital de giro igual a zero) baseia-se na promessa feita pelo fornecedor ao estabelecer o prazo de reposição e, raramente, reserva uma quantidade em estoque. A segurança deste processo somente poderia ser alcançada caso a WebStore reservasse o estoque do fornecedor quando do fechamento do pedido. Porém, este procedimento é muito raro, devido às dificuldades de integração e à qualidade da informação do estoque do fornecedor. O pressuposto é que os fornecedores irão sempre entregar as mercadorias previamente vendidas no prazo de reposição acordado.
  4. Na esmagadora maioria das pequenas e médias loja virtuais a WebStore não controla estoque, ou seja, admite-se que todos os itens expostos à venda tenham unidades disponíveis estoque. Em outros termos, há o pressuposto do estoque infinito.

As novas práticas para o cumprimento da lei

  1. No fechamento do pedido, a WebStore deve permitir ao cliente a escolha da data de entrega e o turno para cada item, desde que seja capaz de cumpri-los (isto é, deverá considerar todos os pedidos em curso de atendimento). A referência para a determinação da data de entrega passou a ser a data de fechamento do pedido na WebStore, quando anteriormente era a data da aprovação do pagamento.
  2. Quando da transferência do pedido para o Back-office, o cliente recebe email atestando que seu pedido teve o processamento bem-sucedido e que deverá ser submetido ao processo de pagamento. Nisso, não houve diferença.
  3. Quando da aprovação do pagamento, o cliente é formalmente informado por email sobre a data e o turno em que será efetuada a entrega de cada um dos itens do pedido de acordo com a escolha feita anteriormente na WebStore. Este email passou a ser simplesmente o documento comprobatório do acordo com o cliente na WebStore.

As novas necessidades

  1. O prazo de entrega passou a ser função do meio de pagamento. Caso seja por boleto, a loja não tem controle de quando o cliente efetuará o pagamento.
  2. Novas atividades passam a afetar a data de entrega: a análise de fraude (autenticação estatística do cliente) e o procedimento de pagamento. Isto implica determinar tempos padrões para cada uma delas e controlar seus desvios operacionais.
  3. Deve-se considerar a carga de trabalho do Centro de Distribuição para se determinar o prazo do atendimento físico do pedido. Em outras palavras, o Centro de Distribuição, finalmente, deverá ser tratado como uma unidade produtiva. As restrições do Centro de Distribuição devem ser respeitadas.
  4. Os contratos com as transportadoras devem prever um máximo por rota/turno de embarque em função da disponibilidade. O pressuposto da capacidade infinita de carga deixa de existir.
  5. As relações cliente-fornecedor nas operações de cross-docking devem ser mais duras, caso não sejam integradas via sistema de informação. Vender sem estoque torna-se mais arriscado.
  6. Cada pedido deve ter sua programação de atividades determinada em função da promessa feita pela WebStore, quando de sua aceitação. A realização de cada atividade deve atualizar a programação do pedido de modo que se percebam os desvios operacionais.

Conclusão

O cumprimento da data de entrega prometida ao cliente sempre foi um requisito fundamental para que as lojas virtuais fossem bem-sucedidas. A nova lei, impondo a escolha da data e turno no momento do fechamento do pedido, implica a necessidade de um novo padrão de funcionamento global do comércio não-presencial:

  1. acompanhamento do fluxo de atividades de cada pedido (roteiro, tempos padrões e datas programadas),
  2. gestão do Centro de Distribuição, considerando-o conceitualmente como uma unidade produtiva (planejamento, programação, controle)
  3. gestão de Transportes na contratação e controle dos serviços e no
  4. atendimento aos clientes em caso de reagendamento acionado automaticamente a partir de desvios operacionais (afastamento do realizado face ao programado).

Embora difícil de ser praticada, a lei traz benefícios ao consumidor, restringe a entrada de aventureiros no comércio eletrônico e colabora no sentido de normatizar os critérios de competitividade deste mercado.

Fernando Di Giorgi 03 de dezembro de 2009

https://www.ecommercebrasil.com.br/artigos/a-data-e-o-turno-da-entrega-no-e-commerce/ em 10 de janeiro de 2011

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